VIDA REVERSA

Como seria bizarro virar as coisas do avesso, observar por trás daquilo que se encontra do lado contrário que estamos. Ver o mundo de cabeça pra baixo, andar no teto. Olhar para o chão e ver o céu. Olhar para cima e ver os próprios pés.

Imagine só como seria pensar no inverso do que se pensa, se dependurar no escuro das ideias e se atirar no abismo do desconhecido. Aprender a voar com o vento no rosto e não com o controle remoto na mão. Seguimos fielmente as histórias já relatadas, os finais registrados. Nos acomodamos nas invenções alheias por preguiça de pensar. Colecionadores de padrões e detentores da prepotência de saber no que vai dar.

Quem dera fôssemos reforçados por enxergar do lado de lá e deixar o próprio lado questionável. Quem dera lançar mão dessa existência utópica e dar o pé dessa vida presuntiva. Entrar de cabeça ao invés de ver se a água está fria com a ponta dos pés. Se jogar de barriga ao invés de colocar a boia para amortecer a dor.

A existência seria muito mais compensatória se calculássemos menos a probabilidade do engano e mais a qualidade da satisfação em se tentar. Muito mais gratificante se pensar no que foi realizado para valer que o não feito por merecer.

Nos restringimos a adotar uma linha cronológica conhecida, mas, nos culpamos por seguir sem se aventurar. Nos ludibriamos com as pílulas e negociamos os eventos adversos. Fazemos do sentimento uma quimera, fazemos da vida uma desatino.

Fazemos do tempo um mero coletor de lembranças e do futuro um inacessível depósito de sonhos.

E no agora, estamos o tempo todo correndo contra o tempo. Estamos todo o tempo lutando pro tempo não acabar. Fazemos na pressa, fazemos sem pensar. E até quando se pensa, fica difícil de se acompanhar.

Prolongamos a duração da vida mas comprimimos o viver. Ampliamos o conhecimento mas sintetizamos a experiência. E ao final interrompemos uma vida sem graça de procrastinações ao invés de arrematar uma expansão afável de resultados.

E, caso essa ideia te incomode, não se acomode em apenas ler.